

O tráfico de pessoas para atuar em plataformas ilegais de , as chamadas “bets”, tem se consolidado como uma nova tendência criminosa, segundo o Relatório Nacional sobre Tráfico de Pessoas 2024, divulgado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), registra reportagem da coluna Fabio Serapião no Metrópoles.
Com promessas de emprego no exterior, sobretudo em países do Sudeste Asiático, brasileiros vem sendo aliciados por meio das redes sociais e, ao chegarem ao destino, se deparam com condições de trabalho análogas à escravidão em empresas de tecnologia que operam sites ilegais de e fraudes digitais.
De acordo com os dados reunidos pela Coordenação-Geral de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (CGETP), pelo menos há pelo menos 35 registrados envolvendo esse tipo de exploração, principalmente nas Filipinas, Camboja, Laos e Mianmar.
As vítimas são muitas vezes recrutadas online, por conhecidos ou intermediários, e acabam sendo forçadas a trabalhar sob controle rigoroso, tendo documentos como seus passaportes retidos, jornadas exaustivas e ameaças constantes.
“Aquela região vem se consolidando como um grande centro de online, então já tinha esse contexto favorável. E para esse tipo de delito, eles precisam de pessoas. Vários países identificaram esse fluxo justamente porque as redes que atuam lá precisavam de pessoas do mundo inteiro, que falassem em vários idiomas. Então, brasileiros, até americanos foram parar lá,”, explica Marina Bernardes, coordenadora da CGETP.
Ela relata que, inicialmente, os aliciadores oferecem empregos em áreas como atendimento virtual, telemarketing ou suporte digital, em uma tendência que tem se intensificado depois da pandemia.
No entanto, ao chegarem no local, as vítimas se veem presas em instalações vigiadas, obrigadas a executar golpes de toda sorte, inclusive os chamados “golpe do amor”, em que a vítima é enganada com um suposto par romântico fictício, fraudes financeiras, e também a atuar em sistemas ilegais de esportivas.
“Tem todos os golpes que você imaginar, desde o golpe do amor, até pirâmides financeiras, bets, é tudo. É um cardápio completo ali. ”, diz Marina.
Um dos casos mais recentes envolvendo esse tipo de plataforma, e que ganhou repercussão nacional, envolve os dois brasileiros -Phelipe Ferreira e Liukas Santos -, ambos vítimas de tráfico humano resgatados em Mianmar.
A história dos dois segue um roteiro muito similar ao citado por Bernardes. Tanto Phelippe quanto Luckas aceitaram promessas falsas de emprego e acabaram nas mão de uma máfia de golpes cibernéticos em 2024.
Em KK PArk, onde foram resgatados, ambos eram obrigados a trabalhar cerca de 16 horas por dia, vigiados por membros da organização criminosa e eram forçados a aplicar golpes em pessoas das mais variadas nacionalidades.
Phelipe chegou a relatar na época as agressões físicas a que foi submetido por não bater metas diárias estipuladas pelos criminosos. Segundo contou, precisou fazer até 500 agachamentos em uma superfície com objetos pontiagudos, como pregos e era espancado com cassetete.
O relatório também mostra que as autoridades brasileiras estão monitorando uma possível migração do problema para a África, com brasileiros já identificados em esquemas semelhantes na Nigéria. Foram registrados pelo menos cinco casos até agora.[
“Pode ser que eles já estejam buscando outros países para se instalarem. A gente está observando essa tendência, mas por enquanto são poucos, foram cinco brasileiros identificados na Nigéria, e estão atuando com isso”, relata.
Segundo o Ministério das Relações Exteriores (MRE), órgão responsável por comunicar a identificação de potenciais vítimas de tráfico internacional às autoridades, 49 brasileiros foram identificados como vítimas em 2024. Mas os números podem ser muito maiores, já que a subnotificação está presente nesse casos.
“Muitos acham que com isso vão fazer o pé de meia, às vezes vão ter dinheiro lá, mesmo nessas condições de trabalho, em condições análogas à escravidão. Mas depois conseguem sair, vão para outra. A gente já ouviu vários relatos de que eles ficam mudando de localidade, até de aliciadores, de grupos criminosos. Então, é um fenômeno relativamente recente”, relata Marina.
O atendimento a esses casos envolve uma articulação entre órgãos públicos e a tendência de crescimento desses casos levou à criação de um protocolo interinstitucional de resgate. Por meio dele, houve uma organização mais clara de todo o trâmite de apoio às vítimas, desde a comunicação ao consulado até o fluxo de repatriação.
Quando brasileiros procuram um consulado pedindo ajuda, o caso é repassado ao Ministério da Justiça, à Polícia Federal (PF) e à Defensoria Pública da União (DPU), que organiza o retorno e o apoio jurídico.
Investigações avançam
Como mostrou a coluna, no ano passado a PF atingiu um pico de novos inquéritos, com 149 investigações abertas. Desde 2017, já são 662 casos.
Além da repressão, Marina também alerta para a necessidade de campanhas de prevenção voltadas ao público jovem, que representa o perfil mais comum nesse tipo de tráfico internacional.
“São pessoas jovens que têm essa vontade de rodar o mundo, de buscar coisas fora, de ter novas experiências, e acabam se vendo nessas situações”, explica.
Ela também destaca o novo desafio da exploração puramente virtual, sem deslocamento físico da vítima. Em alguns casos, explica Bernardes, pessoas são aliciadas, chantageadas e exploradas online em seus próprios países.
“[Esse cenário] derruba uma compreensão equivocada de muita gente, de que para você ter o tráfico, você precisa ter o deslocamento dessa vítima […] Você tem inúmeras possibilidades de como esse crime vai acontecer. Então, o que a gente tem visto, inclusive tentado acompanhar e monitorar, são casos de exploração sexual de pessoas online, em que elas são aliciadas pela internet, por meio plataformas e redes sociais”, afirma.
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